sábado, 19 de fevereiro de 2011

Gula























Fotos de Edward Burtynsky
http://www.edwardburtynsky.com/


O homem devora tudo. Devora a superfície e as entranhas da terra. Devora, psicologicamente, suas próprias entranhas. Devora, hegelianamente, seu próprio passado. Devora, pela ciência, o seu próprio futuro. Devora, pelo espírito, não somente tudo o que é, mas também tudo o que é possível. A sua gula é insaciável. Quanto mais devora, mais e mais depressa precisa devorar.
(...)
O homem devora, por exemplo, a natureza. Primeiro põe a natureza na boca: apreende a natureza. Segundo, engole a natureza: compreende a natureza. Terceiro, digere a natureza: subjuga a natureza. Quarto, expele os detritos da natureza apreendida, compreendia e subjugada: evacua instrumentos (...) A gula humana transforma a natureza progressivamente no excremento humano chamado "parque industrial". Mas a gula não para neste ponto. Volta-se contra o próprio parque industrial para devorá-lo.


Vilém Flusser, in Baitello, Norval. A serpente, a maçã e o holograma. Esboços para uma teoria da mídia. São Paulo: Paulus. 2010.

2 comentários:

Mel disse...

Muito interessante. Nunca havia percebido o confronto do homem com a natureza, sob esse aspecto!

Nilza Prata Bellini disse...

Oi Melania. O Flusser, esse filósofo pouco estudado no Brasil (embora tenha vivido décadas por aqui -- fundou o curso de Comunicação na Faap, por exemplo), é quase um profeta! Obrigada pela visita.